Luiz Nishimori apresentou relatório no final de abril. Comissão especial virou palco de bate-boca entre deputados |
Há quase um mês, a comissão
especial que analisa o projeto que altera as regras de comercialização de
agrotóxicos tenta, sem sucesso, debater o relatório apresentado pelo deputado
Luiz Nishimori (PR-PR). O texto (PL 6299/2002) limita a atuação de órgãos como
a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Instituto Brasileiro do
Meio Ambiente (Ibama) na liberação de pesticidas agrícolas, comumente chamados
de agrotóxicos. Segundo o relator, a ideia é “modernizar” o processo de
liberação dos produtos.
A comissão especial deveria
ter retomado a discussão da matérias na última semana, mas a reunião foi
cancelada em meio à greve dos caminhoneiros e o feriado prolongado. Não há data
prevista para que os deputados se reúnam novamente.
<< Produtores se
contrapõem a ambientalistas e fazem campanha por flexibilização de defensivos agrícolas
O texto, que ganhou dos
ambientalistas o apelido de “PL do Veneno”, sofre grande resistência de
parlamentares e da própria Anvisa, mas tem o apoio da chamada “bancada
ruralista” no Congresso. A matéria principal tramita conjuntamente a outras 28
proposições de conteúdo semelhante. Uma delas tem entre os autores o ministro
da Agricultura, Blairo Maggi (PP), senador licenciado e um dos homens mais
ricos do Congresso.
Nishimori apresentou seu
relatório em 24 de abril. Desde então a discussão tem sido adiada, e uma outra
comissão especial, concebida para criar a política nacional de redução de
agrotóxicos, foi instalada como resposta ao relatório que pretende facilitar o
uso de agrotóxicos.
A falta de consenso entre os
deputados tem gerado discussões acaloradas e troca de acusações. Um bate-boca
elevou a temperatura na reunião mais recente da comissão. Os deputados Ivan
Valente (Psol-SP) e Valdir Colatto (MDB-SC) trocaram ofensas em 16 de maio,
última vez em que o colegiado se reuniu.
Após Valente afirmar que o
relatório de Nishimori favorece a indústria dos agrotóxicos, Colatto chamou o
colega de “mentiroso” e “safado”. O paulista retrucou afirmando que Colatto era
“vagabundo” e estaria ganhando dinheiro com o projeto.
“Modernização”
O relator afirmou à reportagem
do Congresso em Foco que depende da presidente da comissão especial, deputada
Tereza Cristina (DEM-MS), pautar a votação do texto. Ambos são membros da
bancada ruralista na Câmara.
Nishimori refuta o conceito de
“veneno” dado aos agrotóxicos, chamados por ele de defensivos agrícolas. Uma
das sugestões do texto é a permissão para que produtos possam ser
comercializados sob um registro temporário, sem depender da avaliação da Anvisa.
O relator diz que isso não representa riscos à saúde, uma vez que muitos dos
produtos ainda sem registro da agência utilizam ativos já liberados pelo
próprio órgão, mas chegam ao mercado com nomes diferentes. Segundo ele, são
mais de dois mil produtos nessa situação.
O deputado paranaense afirma
ainda que a intenção é diminuir custos aos produtores e o tempo que a Anvisa
leva para liberar novos produtos no mercado. Para ele, o órgão precisa
modernizar seus processos. “A Anvisa tem de mudar também. Ela está há 30 anos
do mesmo jeito, não houve evolução”, afirma Nishimori. As regras da agência
foram estabelecidas em lei de 1989.
Ivan Valente (acenando para a mesa) é um dos principais opositores da flexibilização do uso de agrotóxicos . Reprodução / TV Brasil
A Anvisa divulgou, no início
de maio, uma nota técnica contra o projeto. Para a agência de vigilância
sanitária, a medida retira a competência de avaliação do órgão para criar
apenas uma “homologação”, centralizando no Ministério da Agricultura as responsabilidades
por registro, normatização e reavaliação de agrotóxicos.
O relator argumenta que a
intenção é que as novas regras de liberação integrem o Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), o Ibama e a Anvisa – que avaliam
os produtos individualmente e têm processos e taxas diferentes para a
liberação. “Cada um tem suas funções e ninguém vai tirar essas funções”, diz
Nishimori, que também afirma que a ideia é unificar a taxa e o processo. “A
Anvisa continua com sua avaliação toxicológica e pode reprovar qualquer
produto. O Mapa avalia a eficiência agronômica. O Ibama faz conclusão de riscos
ambientais. Ninguém tira o poder deles, de maneira nenhuma. Apenas estamos
querendo fazer uma entrada só, só um registro”, acrescenta o relator.
Para a Anvisa, “o PL
terceiriza, ainda, as responsabilidades pelas doenças e agravos à saúde do
trabalhador e do consumidor; pelo monitoramento dos resíduos de agrotóxicos e
do uso adequado; pelo acompanhamento sistemático das populações expostas e das intoxicações;
e pelos planos de emergência nos casos de acidentes de trabalho, transporte e
ambientais que possam advir da cadeia produtiva e logística do agrotóxico”.
Nishimori afirmou que
conversou com representantes da Anvisa, mas ao ser questionado pela reportagem,
não soube precisar por que a agência é contra o projeto. “Não sei. Aí você
precisa perguntar para a Anvisa”, respondeu.
Política Nacional de Redução
de Agrotóxicos
Em resposta ao texto,
deputados contrários à matéria se organizaram para criar uma comissão especial
que analisará o projeto que cria a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos
(PL 6670/2016). O colegiado foi constituído em 22 de maio e elegeu o deputado
Alessandro Molon (PSB-RJ) como presidente, que indicou Nilto Tatto (PT-SP) –
autor de relatório alternativo ao de Nishimori na outra comissão – como relator
da matéria.
Após ser eleito para comandar
a comissão, Molon afirmou no Twitter que o projeto prevê a redução gradual e
contínua do uso de agrotóxicos. “Estou muito otimista com este trabalho, porque
aqui a gente vai ouvir instituições que não foram ouvidas na comissão que trata
do projeto de lei 6299, aquela outra que estamos tentando impedir”, disse o
deputado em vídeo postado em sua conta. Molon tem dito em discursos e
intervenções na comissão especial que centenas de entidades são contra o
projeto.
“Centenas de entidades são
contra o PL do Veneno! Não é possível que ignorem opiniões técnicas e científicas
com o mero objetivo do lucro. Se aprovarem a liberação geral dos agrotóxicos, o
Brasil ficará doente!”, escreveu o deputado no post do Twitter.
Cabe à deputada Tereza Cristina, da bancada ruralista, organizar a pauta de trabalhos da comissão especial. Sérgio Francês / PSB |
No voto em separado
apresentado na outra comissão, Nilto Tatto aponta que foram realizadas oito
audiências públicas para debater o projeto, a última delas há mais de um ano,
em 5 de abril de 2017. Ele também critica a adoção do termo “produto
fitossanitário” em vez da palavra “agrotóxico” no relatório de Nishimori –
apresentado, lembra Tatto, no mesmo dia em que foi defendido em solenidade da
Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), a chamada bancada ruralista, que contou
com a presença de dirigentes de associações de grandes produtores de milho,
soja e algodão.
“As entidades lançaram
manifesto pela aprovação do PL 3200/2015, divulgado como a “Lei dos Defensivos”
ou, também, como a “Lei do Alimento mais Seguro”. O manifesto foi convincente.
O texto do Substitutivo do nobre Deputado Nishimori tanto incorporou
majoritariamente o texto do PL nº 3.200, de 2015, como o mote da campanha foi
igualmente materializado no substitutivo”, diz o relatório alternativo do
petista, em crítica ao que classifica como “manobra eufemística” na
substituição dos termos.
A próxima reunião para
analisar o projeto que facilitar o uso de agrotóxicos está marcada para a tarde
desta terça-feira (5). Constam da pauta da comissão especial 24 requerimentos para
realização de seminários e audiências públicas. (FONTE: Câmara dos Deputados)
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